O governo português anunciou neste mês um conjunto de medidas que altera significativamente as políticas de imigração do país. Com foco em maior controle migratório, o chamado “pacote anti-imigração” tem gerado preocupação entre especialistas, organizações da sociedade civil e, principalmente, entre brasileiros — que representam a maior comunidade estrangeira em Portugal.
O que muda na prática
Entre as principais alterações está o fim do regime de manifestação de interesse, uma das formas mais comuns de regularização de estrangeiros em Portugal. Até então, imigrantes que entravam legalmente no país, mesmo sem visto de trabalho, podiam iniciar o processo de residência caso comprovassem vínculo empregatício após três meses.
Com a revogação desse modelo, será obrigatório que o trabalhador estrangeiro chegue ao país com um contrato formal de trabalho e visto obtido no país de origem. Ou seja, para quem está no Brasil, a regularização só será possível antes do embarque.
Além disso, o governo pretende reforçar a fiscalização sobre empregadores que mantêm trabalhadores em situação irregular, impondo multas mais elevadas e ampliando a vigilância sobre fraudes e exploração. As regras também dificultam a transição de vistos de estudante para residência de trabalho, e tornam mais rígido o processo de reagrupamento familiar.
Brasileiros na linha de frente dos impactos
Mais de 400 mil brasileiros vivem em Portugal, e boa parte da comunidade utilizou, nos últimos anos, o regime agora extinto para se legalizar no país. Muitos entraram como turistas, conseguiram emprego e deram entrada na documentação por meio da manifestação de interesse.
Agora, esse caminho está encerrado. As novas regras afetam tanto quem ainda está no Brasil e planejava imigrar quanto quem já está em Portugal e aguardava a análise do processo — o que, até então, podia levar anos diante da sobrecarga no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), hoje reestruturado como AIMA (Agência para a Imigração e Mobilidade).
Organizações como o SOS Racismo e o Centro de Apoio ao Imigrante (CLAII) já se manifestaram publicamente contra as mudanças, alertando para os riscos de aumento da informalidade, exclusão social e precarização das condições de vida dos imigrantes.
Críticas e contexto político
As novas regras foram propostas pelo governo do primeiro-ministro Luís Montenegro (Partido Social Democrata), com o argumento de “ordenar os fluxos migratórios” e combater “abusos do sistema”. No entanto, críticos apontam que o pacote foi influenciado pela pressão de partidos de direita e extrema-direita, como o Chega, que ganharam força nas últimas eleições com um discurso nacionalista e anti-imigração.
A oposição, partidos progressistas e movimentos sociais acusam o governo de retroceder em direitos humanos e de mirar justamente na população imigrante que mais contribui economicamente e demograficamente para o país. Portugal enfrenta desafios como o envelhecimento populacional e a escassez de mão de obra em setores essenciais — fatores que, segundo especialistas, exigiriam mais inclusão, e não restrição.
O que fazer agora
Para brasileiros que pensam em se mudar para Portugal, a recomendação é buscar informações diretamente nos canais oficiais — como os consulados portugueses e o site da AIMA — e não embarcar sem visto adequado. Quem já está no país em situação irregular ou com processos pendentes deve acompanhar de perto as orientações das autoridades e, sempre que possível, procurar apoio jurídico ou de entidades ligadas aos direitos dos imigrantes.
A entrada em vigor das medidas será gradual, mas o impacto já é sentido por milhares de pessoas que veem seus planos de vida e trabalho suspensos ou inviabilizados.