“Conta-se a seguinte experiência, vivida por um grande médico paulista muitos anos atrás. Durante o período em que trabalhou entre os índios xavantes, no Mato Grosso, ele fez amizade com um dos nativos, Rupawe, que o acompanhava frequentemente e lhe contava diversas histórias de sua tribo.
Numa tórrida tarde dessa região central do Brasil, os dois decidiram refrescar-se no rio das Garças. Nadaram durante quase uma hora e depois se sentaram à beira das águas para descansar e apreciar a bela paisagem. A agradável sensação da brisa tocando seus corpos pareceu despertar no médico pensamentos mais sutis, resultando neste curto diálogo:
– Você é feliz, Rupawe?
– Sim – respondeu prontamente o nativo.
– E você sabe o que é felicidade?
– Não.”
Esta história me fez lembrar do dia em que perguntei a minha filha Helena, (na época ela estava com 3 aninhos), se ela me amava. Prontamente, ela me respondeu que, sim! Não satisfeita eu a perguntei se ela sabia o que era o amor, surpreendentemente ela me disse: “Eu não sei dizer o que é, eu só sei sentir!”
Neste momento, percebi quão imatura foi minha pergunta, porque o amor é imaterial, de modo que tentar entendê-lo, assim como tentar entender a felicidade, é se forçar a sentir tais sentimentos. Entretanto, posso dizer que felicidade e o amor não são uma constante, aliás está muito além de não saber o que é ou quando se os sente.
Afinal, tudo o que uma pessoa faz, ela faz tendo em vista a sua felicidade. Mesmo o mais abnegado humanista, que abdica dos seus prazeres e confortos em benefício do próximo, também faz isso pela sua própria felicidade, por que se sente bem fazendo isso.
Talvez o filantropo obtenha uma felicidade mais consistente do que o avarento que só pensa em dinheiro e não consegue gastá-lo nem consigo mesmo, o que dirá com os outros. De qualquer modo, em ambos os casos a felicidade não é estável, segura. O avarento só se satisfaz no fugaz momento em que ganha algum dinheiro, e no minuto seguinte já está preocupado em como investi-lo da melhor maneira ou em como escondê-lo dos outros. Mas o filantropo também se perturba e se sente infeliz ao reconhecer seus próprios limites de não conseguir ajudar todos o tanto quanto queria, entre outras coisas.
Há também aqueles que procuram garantir a felicidade por meio da busca contínua pelos prazeres da vida, e o destino deles também é a mesma infelicidade. Pois os sentidos se cansam dos objetos, e se tornam mais exigentes, perdendo o interesse nos deleites costumeiros e reivindicando novos e mais extravagantes. No final, o sujeito está esgotado e infeliz.
Ainda que nunca alcancemos plenamente a felicidade que buscamos, não conseguimos abdicar desta busca. Sempre que buscamos por algo e não o alcançamos depois de algumas tentativas (ou de muitas, se formos teimosos), nós naturalmente desistimos da busca. Mas a busca por felicidade não se enquadra nesta categoria, afinal ninguém desiste da felicidade!