“Vergonha impede mulheres de fazer denúncia de violência”, diz defensora pública

Após o Webterra noticiar um crime de violência contra uma mulher que morreu depois de apanhar do marido, em Montes Claros, uma norte-mineira chamou a atenção na nossa rede, explanando o drama familiar que viveu. Uma história de dor, resiliência e superação onde a personagem principal viu o fim do túnel, mas conseguiu reverter a situação humilhante vivenciada por ela.

História de superação 

Há cinco anos, Vanice Alves Cardoso, conseguiu se livrar de um pesadelo diário: a violência física. Com 17 anos, recém-chegada à cidade ela viu no casamento, a liberdade. Mas, o que era uma salvação, se tornou uma triste realidade.

“Eu cheguei a Montes Claros muito nova. Eu conheci meu ex-marido aqui na cidade e, com três meses de namoro, eu casei, porque eu fiquei com medo de meus pais virem me buscar e me levar para a roça novamente, e eu não queria isso, por isso eu casei sem saber quem era a pessoa”, conta Vanice.

Vanice ficou casada por 14 anos e há cinco se separou. Com dois filhos ela conta que eles também sofreram e enfrentam consequências por causa disso.

“Meus filhos sofriam muito, junto comigo, e então no segundo que eu tive, eu resolvi que não dava mais para aguentar e separei. Hoje, meu filho mais velho, ainda sofre alguns reflexos das agressões que nós vivemos”, relata.

As agressões, que eram sem motivos aparente, aconteciam em casa e na rua. Eram físicas e verbais.

“Eu digo a todo mundo que quando o homem nasceu com um jeito ruim, agressivo, ele sempre será assim. Eu vivi com meu marido achando que ele iria mudar, que ele me batia apenas quando estava bêbado, mas, não era verdade”, afirma Vanice.

Hoje Vanice é cantora e tem uma banda junto com os dois filhos.

“Muita gente conhece minha história e me tornei um exemplo. Nós não devemos depender de homem e nem depositar nossa alegria neles, amor é diferente de carência. E um conselho que eu dou é: não espere o segundo tapa ou segundo agressão, denuncia. Hoje eu me sinto uma pessoa livre”, aconselha.

Casos assustadores.

Um diagnóstico realizado pela Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp) em 2017 mostra que a faixa etária prevalecente entre as mulheres vítimas, com 30%, é de 25 a 34 anos de idade, sendo que 73% delas tinham entre 18 e 44 anos de idade. Além disso, em 38% dos casos os agressores são cônjuges e companheiros e, em 31%, ex-cônjuges e ex-companheiros.

Dados de Montes Claros

Neste mesmo diagnóstico, que usou um termômetro para definir as agressões, em 2016, Montes Claros estava abaixo da média. Foram registradas 1.840 violências físicas no primeiro semestre e 1.815 no segundo. Já a psicológico foram 1.850 e 1.813 nos mesmos períodos citados.

“Infelizmente esta violência é resultado de nossa cultura extremamente machista e patriarcal. Estamos enfrentando uma verdadeira epidemia e a violência está levando várias mulheres à morte, em função das agressões perpetradas, pois a lei não está tendo a devida efetividade. A dependência financeira e psicológica inibem a denúncia. A mulher por depender do companheiro, por possuir filhos e não ter renda e trabalho, se submete a estas condições. A vergonha também a impede de denunciar, eis que, a sociedade  naturaliza a violência e, sempre remete a mulher a culpa”, ressalta Maíza Rodrigues, defensora pública.

Entenda o caso

A Polícia Civil apresentou à imprensa, na tarde desta segunda-feira (19), os detalhes de um crime que chocou a região. Um homem, de 36 anos, espancou e matou a esposa, de 34 anos e, em seguida, alegou que a mulher teria caído de moto e tentou receber dinheiro do seguro DPVAT.

Ele foi localizado na Estrada da Produção, em Montes Claros, no Norte de Minas. De acordo com a PC, Vilmar Rodrigues Soares, tinha o costume de agredir a esposa. Ele foi preso após confessar o crime para o cunhado.

Contestação

Em nota, a defesa de Vilmar informou que “vê a prisão dele como abusiva e desnecessária. Essa afirmação se funda no fato de que tão logo o crime tenha ocorrido, o autor, devidamente acompanhado de seu advogado compareceu à Delegacia, onde prestou todos os esclarecimentos, inclusive confessando que teria sido o autor das agressões, mostrando-se muito arrependido e se colocando à disposição da justiça. Com base nesses fatos, a sua prisão se aparenta muito mais como um espetáculo midiático do que uma necessidade jurídica processual. Quanto ao mérito dos fatos, a defesa somente irá se manifestar após a existência de uma acusação formal, o que ainda não existe. É preciso deixar claro ainda que, em nenhum momento, o autor dos fatos pleiteou o seguro DPVAT. Essa história surgiu a partir do momento em que ocorreu o óbito e, foi dito realmente que a morte teria se dado em razão de uma queda de moto, momento em que o autor foi orientado pela Polícia Civil que o atendeu, a registrar um Boletim de Ocorrência para que pudesse pleitear o referido seguro, caso quisesse. Ressalto ainda que quando o policial deu essa orientação ao autor, ele ainda não sabia a real causa da morte”.