Apesar da diminuição do uso prático, o carro de boi ainda é valorizado como um elemento cultural e histórico em Salinas, por Dino.
Um dia, Délio Pinheiro disse que minha escrita é uma amálgama de Guimarães Rosa e Mia Couto, isso ficou tão fixado na minha mente que escrevo sempre inspirado nestes dois grandes escritores.
Eu sempre começo de algo real, que vou fantasiando, sonhando, funcionando e escrevendo.
Meus personagens são pessoas do Cerrado, já as de Guimarães são do Sertão e as de Mia Couto da Savana.
Como Rosa, uso da linguagem regional e exploro da cultura do Cerrado; ela é a cultura do sertão.
São mundos reais, misturados e imaginários, territórios de memórias e histórias.
Hoje escrevo sobre o carreiro, trabalhador com parelhas de bois, uma profissão em extinção.
Um dos trechos mais marcantes da minha conversa com Dino, foi quando ele disse que seu trabalho é algo divino.
– “Meu trabalho Milton, é um dos dons mais preciosos que Deus me deu. O dom de amansar e respeitar os bichinhos, que nos ajudam a ganhar a vida…”
Parafraseando Rosa, eu faço versos para os bois de Dino.
Boi carreiro
É parelha,
de Pintassilgo e Boqueirão,
são bois mansos,
que vêm do Cerrado.
E os cascos fortes,
do trabalho pesado.
Vão pelas ruas de pedras de Salinas,
patrimônio de Minas.
Bois bons,
chifres pontiagudos,
canga, canzil e broxa no pescoço,
guiados pelo Roberto,
bom moço.
Que trabalho pesado,
anda por toda cidade,
por essas ruas afora,
carregando esporão ou espora,
alegria e felicidade.
Carro de bois cheio de areia,
das águas de um rio, chamado Salinas,
pedaço de Minas.
Bois brancos,
garrotes mansos,
zebus enormes,
cheiro de curral.
Pega a guia Roberto,
e vamos embora,
nosso dia começou na aurora.
Também inspirado em Mia Couto e após conversar com Dino e Roberto, identifiquei que a fadiga é um sintoma da falta de sentido na vida, e não da quantidade de trabalho em si.
– “Pra nós, o cansaço é maior quando se vive sem sonhos, sem uma aspiração para o futuro”.
A preguiça, a falta de estímulo e propósito no dia a dia contribuem para o esgotamento, mais do que a carga horária de trabalho.
O trabalho é visto como um meio para alcançar uma vida com sentido e propósito, não como um fim em si mesmo.
As palavras de Dino e Mia Couto convidam à reflexão sobre a importância de encontrar significado na vida e de não se deixar consumir pela rotina e pela falta de propósito e trabalho.