Apenas nos cinco primeiros meses deste ano, o número de pessoas presas por não pagamento de pensão alimentícia já ultrapassou o de 2021 todo. De acordo com dados divulgados pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), de janeiro a maio, foram 2.798 detidos pelo não cumprimento do compromisso. No ano passado, de janeiro a dezembro, foram 2.337. O órgão não detalha quantos presos são homens e quantos são mulheres.
Os números ainda mostram que o número de prisões pelo não pagamento de pensão também aumentou consideravelmente na comparação entre 2020 e 2021. No ano retrasado, foram 575 detidos, revelando que 2021 registrou alta de nada menos do que 306% na comparação com 2020.
Especialistas no tema entrevistados destacam que o avanço dos números pode ser explicado por diferentes motivos, não somente econômicos, embora essas razões tenham grande contribuição. A pandemia da Covid-19, a crise financeira e o empobrecimento da população são apontados como causas relevantes. O fato de mais genitores estarem procurando pelos direitos de seus filhos e até mesmo a falta de conhecimento dos devedores em relação a como lidar com a dívida também contribuem para a alta.
“A gente vem passando por uma crise econômica decorrente da pandemia. A condição financeira de grande parte da população sofreu uma piora, o que causa reflexos na questão da pensão. Os alimentos podem ser revistos, mas é preciso que o devedor entre com uma ação e mostre que teve redução na possibilidade financeira. Pode ser que muitas pessoas que passaram por esse empobrecimento não deram conta de pagar a pensão, mas não tomaram nenhuma medida em relação a isso”, diz a defensora pública Paula Pinto.
Além disso, como as questões financeiras afetaram grande parte das pessoas, isso também inclui quem tem a guarda da criança. Muitas vezes, o genitor que acabava dando conta de sustentar o filho sozinho e, por isso, não recorria à Justiça, deixou de ser conivente com a situação do devedor, conforme explica Paula.
“Pai dos filhos atrás das grades”
Se, por um lado, aumentou o número de pessoas que não pagam pensão alimentícia no Estado, por outro, os dados ainda podem não refletir com exatidão a quantidade de pais e mães que não cumprem com o acordado na Justiça. Em conversa com pessoas que atualmente lutam sozinhas para sustentar os filhos, mas não levam o caso às autoridades. Os motivos são vários: vão desde a vergonha, passando pelo orgulho, até o sentimento de não querer ver “o pai dos filhos atrás das grades”.
“O pai das minhas filhas não paga pensão para elas há mais de cinco anos. Eu cobro, mas ele finge que não lê as mensagens e também não atende as minhas ligações. Eu queria ‘botar na Justiça’, mas como eu explico para as meninas que o pai foi preso? E por minha culpa?”, diz uma mãe que não quis se identificar.
Outra mãe, que também pediu anonimato, afirmou que se sente mal por cobrar a pensão alimentícia. Na opinião dela, isso é algo “humilhante”. “Eu sei que não deveria pensar assim, mas meu orgulho não deixa. Quero mostrar para ele que dou conta de sustentar o nosso filho sozinha. Também tenho vergonha de imaginar que as pessoas podem pensar que não dou conta sozinha. Inclusive, não vai colocar meu nome na reportagem, ok?”, diz ela.
No entanto, a pensão alimentícia é um direito da criança. Além disso, conforme explica o coordenador do curso de direito do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec BH), Rodrigo Capanema, não necessariamente o devedor irá para a prisão caso a causa vá para a Justiça. “O credor de alimentos pode ingressar pelo rito da prisão ou, então, pelo da penhora de bens”, afirma ele.
Independentemente do que for solicitado, o devedor será ouvido, conforme explica Capanema, e poderá justificar o porquê de não estar pagando a pensão. Porém, alerta ele, apenas situações muito específicas e analisadas caso a caso poderão talvez ser uma justificativa. Um exemplo é o caso de um devedor que sofreu um acidente grave ou ficou em coma por um tempo. Desemprego, por exemplo, não retira a obrigação do devedor, conforme destaca Paula Pinto.
“O filho continua tendo necessidade de comer. Os pais precisam sustentar a criança que está ali, pois a necessidade dela não acaba por conta do desemprego deles. Como os dois são provedores, os dois precisam contribuir. Se a pessoa está desempregada, presume-se que ela vai conseguir no trabalho informal uma média igual ao salário mínimo”, afirma a defensora pública.
Se o devedor realmente não pagar a pensão e houver a prisão, segundo Paula, ele pode ficar detido por um período de um a três meses. Se essa pessoa paga a pensão nesse tempo, ela é solta. Caso contrário, deverá cumprir toda a pena.
A partir desse cumprimento, explica Paula, a dívida vai ser convertida para um processo de penhora. A pessoa, então, não pode ser mais presa por aquela dívida em específico. Porém, pode ir para a prisão caso continue não pagando a pensão e faça uma nova dívida. “Durante a vida, há casos de pessoas que são presas mais de uma vez por esse motivo”, relata a defensora pública.
[Com informações de O TEMPO]