Coluna Sal da Terra: temas que incendeiam a atualidade

Imagem: Dynamica Soft/Internet

Sempre me situei como centro-esquerda no espectro ideológico, e como assistente social faço parte da ala progressista de hoje e reflito quando Mia, disse: – “o mundo se torna a cada dia um lugar mais complexo”.

Mesmo escrevendo sobre coisas complexas, busco de alguma forma surpreender o leitor, e fazer com que aquele que está lendo realmente perceba que existe um mundo ali, oculto, que de repente se revela de uma maneira mais poética.

Em meio à ascensão do politicamente correto, hoje nesta coluna vou trabalhar 4 temas que incendeiam a atualidade, só pra citar alguns, com apoio de uma entrevista com Mia Couto, que me instiga a ficar encantado logo no início, percebendo que aquilo que está ali, é uma espécie de visão poética do mundo.

1. Movimento revisionista.
2. Adoção da linguagem neutra.
3. Inteligência artificial.
4. Fenômeno de ascensão da extrema direita no Brasil e no mundo.

Veja parte da entrevista de Mia.

Sobre o Movimento revisionista, o consagrado escritor é contra a onda do revisionismo guiada pelo politicamente correto, filtro em que enxerga desnecessários excessos, ele disse: – “Sempre que tentam fazer isso, o resultado é desastroso para a arte da escrita”.

Uma vez, em visita à Alemanha, fui chamado por uma editora que estava traduzindo um dos meus livros.

Na história, um capitão português que vive no ano de 1890 chama um africano de preto em um dos diálogos.

Era a forma dele, colonial, de se expressar. Havia um contexto. Mas o tradutor alemão insistiu que não poderia usar aquele termo. Eu então perguntei qual seria sua sugestão. E veio a resposta: “Use um ‘excessivamente pigmentado’ no lugar de preto”.

Aceitou a sugestão? Não. Achei um absurdo total, até porque este “excessivamente pigmentado” embute uma subjetividade que também pode resvalar em preconceito. A moda do revisionismo gera situações ridículas, que acabam por fragilizar o movimento da diversidade e da inclusão — este, sim, sério e respeitável.

O senhor diria que o revisionismo é uma modalidade de censura? É uma censura, sim. E pior: feita contra alguém que provavelmente já não está mais vivo e não tem direito à palavra. Essa ala da sociedade que sai por aí alterando grandes obras pretende purificar o passado. A revisão possível, a meu ver, deve se restringir a adicionar observações em um livro explicando o contexto histórico em que foi escrito. As mudanças não podem ser na base da subtração ou da substituição, mas do acréscimo de informações. Assim, é razoável.

Até li um trecho de um jornal jornal britânico, os livros terão o seguinte aviso: “Esse livro foi escrito em uma época em que termos e atitudes que podem ser consideradas ofensivas por leitores modernos eram comuns. Algumas atualizações foram feitas nesta edição, tentando se manter o mais próximo possível ao texto original e ao período em que se passa”.

Qual sua posição no candente debate sobre o uso da linguagem neutra? Se eu fosse parte de uma minoria, provavelmente também brigaria pelo emprego dessa linguagem. Mas, honestamente, não considero uma pauta essencial, por seu baixo potencial de produzir mudanças verdadeiramente significativas. Já aconteceu de eu entrar em reuniões por vídeo chamada, falar “bom dia a todos e todas” e aí alguém emendar: “Você precisa incluir o todes”. Não acho que isso deva ser imposto como uma regra universal. Agora, se eu estiver conversando com uma pessoa que prefere ser tratada com neutralidade, vou respeitar. O problema é fazer um alvoroço em torno do tema, o que termina por insuflar desnecessariamente o pessoal da extrema direita.

A que o senhor atribui o atual fenômeno de ascensão da extrema direita no Brasil e no mundo? A humanidade tem enfrentado uma sequência de crises econômicas e sociais. As pessoas perderam a sensação de segurança, estão com medo e temem pelo futuro de seus filhos. Acho que é uma questão para além da política — ela é existencial. Somos uma espécie que busca produzir sentido à vida, e essa sensação de ausência de propósito acaba justamente por constituir um terreno propício ao crescimento do populismo de extrema direita, que vive o tempo todo em um discurso messiânico e salvador.

E a esquerda, espectro com o qual o senhor sempre se identificou, não tem dado conta de neutralizar o avanço dos radicais da direita? Não. A esquerda vem adotando um discurso de tom apocalíptico, ambientado no fim do mundo. Enquanto a direita se vende como a salvadora que detém todas as respostas, o outro lado espalha a desalentadora ideia de que está tudo ruindo. Sou de esquerda, sim, mas não sei nem mais de que esquerda exatamente faço parte.

Depois do lançamento do ChatGPT, ferramenta de inteligência artificial, veio à tona uma necessária discussão sobre os limites éticos desse recurso.

Acha que os escritores estão ameaçados pela possibilidade de uma máquina produzir com eficácia um bom texto literário? Sinto um terror absoluto em relação a isso e, sinceramente, não quero estar vivo para ver os desdobramentos mais radicais da inteligência artificial.

Antes de tudo, acho que há um erro básico em comparar a lógica mecânica de um computador à capacidade humana de pensar.

São coisas totalmente distintas. E nunca, jamais devemos perder o estímulo ao raciocínio e à reflexão.