Estudo revela expressiva prevalência de vício em internet entre estudantes de Montes Claros

O artigo “Prevalence of internet addiction and associated factors in students“, que acaba de ser publicado pela revista Estudos de Psicologia, apresenta os resultados de uma pesquisa, por amostragem, que concluiu que o uso excessivo e compulsivo da internet afeta a maioria dos estudantes do ensino médio e superior em Montes Claros, no norte de Minas Gerais. Com uma tradução do título para o português, a pesquisa “Prevalência de adicção em internet e fatores associados em estudantes” é oriunda da tese de doutorado “Estudantes online: uso e dependência de internet”, do pesquisador Alexandre Botelho Brito, professor do Instituto Federal do Norte de Minas Gerais (IFNMG), Campus Montes Claros.

A partir de uma investigação epidemiológica, transversal, quantitativa e analítica, o estudo teve como população 2.519 estudantes do ensino médio e superior matriculados em instituições públicas e privadas da zona urbana de Montes Claros. Os estudantes responderam ao Internet Addiction Test (IAT), questionário composto por 20 itens, variando de 20 a 100 pontos. O teste estabelece três categorias conforme a pontuação: usuário mediano, que tem total controle sobre o uso da internet (20 a 39 pontos); usuário problemático, que apresenta problemas ocasionais devido ao uso da internet (40 a 69 pontos); e usuário com vício em internet, que tem problemas significativos por causa do uso da internet (70 a 100 pontos).

Por meio desse recorte, o trabalho estimou que, em relação ao vício em internet, cerca de 6% dos estudantes têm problemas significativos e 46% apresentam problemas ocasionais. Isso significa que mais da metade dos pesquisados (52,3%) apresenta problemas por causa da dependência em internet, estando nas categorias usuário problemático e usuário com vício. O estudo constatou que quase todos os usuários utilizam a internet diariamente e que o tempo conectado gasto é com atividades relacionadas ao lazer.

Também houve prevalência do sexo feminino em relação ao uso da internet. No ensino médio, foram identificados os seguintes fatores: mulheres e meninas, idade superior a 16 anos, classe C, consumo de álcool, sono prejudicado, uso frequente de redes sociais e tempo gasto conectado. No ensino superior, a pesquisa apontou os seguintes fatores: mulheres e meninas, idade superior a 23 anos, atividade remunerada, classe C e D/E, consumo de álcool, sono prejudicado, alimentação desequilibrada, uso frequente de redes sociais e tempo gasto conectado.

O pesquisador explica que também são problemas ocasionados pelo uso exagerado da internet a perda de interesse por questões sociais externas ao ambiente online, a atenção voltada para a conexão permanente e a manifestação de transtornos de humor ao tentar diminuir o tempo conectado. “Não podemos descartar a parte positiva da internet para o ensino, inclusive, mas o estudo focalizou a adicção em internet, ou seja, o uso exagerado, principalmente das redes sociais. E os problemas mais visíveis são o aumento do nível de ansiedade e a depressão”, afirma o servidor Alexandre Botelho.

Na discussão do artigo, os benefícios da internet são considerados, inclusive como recurso importante para o aprendizado dos alunos. Contudo, o estudo propõe a seguinte ressalva quanto ao uso da internet: “quando seu uso se torna abusivo a ponto de levar ao descontrole, pode se tornar prejudicial ao indivíduo e prejudicar as relações familiares, sociais, estudantis, de trabalho e de autocuidado, levando a consequências patológicas de ordem física e mental”.


“Não podemos descartar a parte positiva da internet para o ensino, inclusive, mas o estudo focalizou a adicção em internet, ou seja, o uso exagerado, principalmente das redes sociais. E os problemas mais visíveis são o aumento do nível de ansiedade e a depressão”, Alexandre Botelho Brito, professor do Instituto Federal do Norte de Minas Gerais (IFNMG), Campus Montes Claros


O artigo recém-publicado também é assinado pela sua orientadora Marise Fagundes Silveira, pelas suas coorientadoras Lucinéia de Pinho e Maria Fernanda Santos Figueiredo Brito, pela professora Kewla Dias Pires Brito, do IFNMG-Campus Pirapora, e pelos demais pesquisadores da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes): Cássio de Almeida Lima, Rafael Silveira Freire, Romerson Brito Messias e Luiz Fernando de Rezende.

Quanto aos aspectos da revista, Estudos de Psicologia é uma publicação avançada do programa de Pós-Graduação em Psicologia do Centro de Ciências da Vida da Pontifícia Universidade Católica de Campinas. O periódico está classificado como A1 na lista Qualis/Capes e é indexado nas seguintes bases de dados nacionais e internacionais: Clase, DOAJ, Index Psi, Latindex, LILACS, PsycINFO, Psicodoc, RedaLyc, Scopus e SciELO.

O gráfico, presente no artigo, mostra a prevalência de vício em internet por nível de escolaridade (ensino médio e superior). No ensino médio, há prevalência da categoria usuário problemático (que apresenta problemas ocasionais devido ao uso da internet). No ensino superior, a prevalência é de usuário mediano (que tem total controle sobre o uso da internet). Contudo, nota-se que no superior a categoria usuário problemático alcança 43,3 % dos acadêmicos 

Acontece na novela e na vida real

“Todos que leem o artigo me falam do personagem Theo, na novela Travessia, da TV Globo”, conta o pesquisador Alexandre Botelho, que confirma: “é, sim, o mesmo caso da novela”. Nessa produção televisiva, Theo é um jovem viciado em jogos eletrônicos que passava horas jogando. No decorrer da trama, ele passou a negligenciar sua higiene pessoal, dormir pouco, faltar às aulas, perder o interesse pelas atividades que antes o faziam feliz e ficar cada vez mais isolado.

A novela está terminando e tudo indica um desfecho feliz para o personagem. Mas saindo da teledramaturgia, a realidade é preocupante. Em 2022, o vício em jogos eletrônicos foi considerado uma doença pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Para que o transtorno do jogo seja diagnosticado, são verificadas a perda de controle sobre o tempo de jogo, a prioridade dada aos jogos em relação a outras atividades importantes e a decisão de continuar de frente à tela apesar dos efeitos negativos.

A pesquisa sobre o vício em internet entre estudantes foi premiada em segundo lugar no 2º Congresso Nacional em Oncologia, realizado em Montes Claros. O professor e pesquisador Alexandre Botelho investiga desde 2015 o uso excessivo e compulsivo da internet, ocorrência designada pela expressão “adicção em internet”

O pesquisador Alexandre aponta que os resultados da pesquisa indicaram que usuários com problemas em relação ao uso da internet e usuários dependentes foram maiores entre os alunos do ensino médio. Nesse cenário, Alexandre destaca que os professores, na sala de aula, não têm o poder de controlar os conteúdos acessados e que a resolução desse problema de saúde pública demanda ações integradas e coletivas.

No trabalho “Prevalence of internet addiction and associated factors in students“, os autores propõem: “os profissionais das áreas de saúde e educação, juntamente com toda a sociedade, devem (re)reconhecer esta problemática, o que denota a necessidade de capacitação profissional e educação em saúde para a população. Nesse sentido, sugere-se que os profissionais da Atenção Primária à Saúde, por sua proximidade com a comunidade, adotem ações de prevenção, rastreamento e monitoramento da dependência de internet em conjunto com o Programa Saúde na Escola. Essas ações educativas são necessárias e urgentes uma vez que o presente estudo constatou que cerca de 50% dos alunos pesquisados são Usuários Problemáticos da Internet e, portanto, estão a um passo de se tornarem dependentes”.

Uma nova pesquisa sobre a adicção em internet está sendo realizada pelo professor Alexandre Botelho. Desta vez, a população da pesquisa contempla os cursos do ensino médio integrado do IFNMG-Campus Montes Claros. “Estamos pesquisando a prevalência de dependência de internet e fatores associados entre os estudantes dos cursos técnicos integrados do Campus Montes Claros, mas de forma progressiva, ou seja, neste ano, já desenvolvemos a pesquisa com os primeiros anos. No ano que vem, pesquisaremos as mesmas turmas, que estarão nos segundos anos. E em 2025, investigaremos os mesmos estudantes, que estarão nos terceiros anos”, explica o pesquisador.

Alexandre informa que os resultados dessa nova pesquisa referentes aos primeiros anos serão divulgados em breve.

Participaram do estudo 2.519 estudantes do ensino médio e superior de Montes Claros. Mais da metade apresentaram problemas em relação ao uso exagerado da internet. O estudo aponta que a adicção em internet pode ter diversos efeitos negativos, como o isolamento social, o comprometimento da vida acadêmica e profissional, problemas de saúde mental e física, como ansiedade, depressão, dores de cabeça e insônia, e a dificuldade em controlar o uso da internet